Volume II: Da independencia do Brasil à Lei Áureao
Laurentino Gomes – porto editora – Rio de Janeiro, 2019
- escravidao 2. Brasil 3. historia
Depois de receber diversos prêmios com a série 1808, 1822 e 1889, o escritor Laurentino Gomes dedica-se a uma nova trilogia de livros sobre a história brasileira. Desta vez, o tema é a escravidão e seu profundo e definitivo impacto na formação do Brasil e da sociedade em que vivemos hoje. Composta por uma série de ensaios e reportagens de campo, a obra é resultado das leituras, pesquisas e observações feitas pelo autor ao longo de seis anos em viagens por doze países e três continentes. O volume inicial, lançado em 2019, cobriu um período de mais de 250 anos, do primeiro leilão de cativos africanos em Portugal, em 1444, até a morte de Zumbi dos Palmares, em 1695. O segundo livro concentrou-se no século xviii, auge do tráfico negreiro no Atlântico, motivado pela descoberta das minas de ouro e diamantes no Brasil e pela disseminação, em outras regiões da América, de lavouras de uso intensivo de mão de obra cativa. Este terceiro e último volume é dedicado ao século XIX; à Independência; ao Primeiro e ao Segundo Reinados; ao movimento abolicionista, que resultou na Lei Aurea de 13 de maio de 1888; e ao legado da escravidão, que ainda hoje emperra a caminhada dos brasileiros em direção ao futuro. A escravidão era, na definição de José Bonifácio de Andrada e Silva, o Patriarca da Independência, “um cancro que contaminava e roía as entranhas da sociedade brasileira”. Disseminado por todo o território, o escravismo perpassava todas as atividades e todas as classes sociais. Ricos e pobres, fazendeiros, comerciantes e profissionais urbanos, instituições públicas e empresas privadas, ordens religiosas, bispos e padres, brancos, mestiços e mesmo negros libertos todos, indistintamente, eram donos de escravos ou almejavam sê-lo. Maior território escravista da América em 1822, o Brasil assim se manteria até o final do século XIX, com sua rotina pautada pelo chicote e pela violência contra homens e mulheres escravizados.
Paranaense de Maringá e sete vezes ganhador do Prêmio Jabuti de Literatura, Laurentino Gomes é autor dos livros 1808, sobre a fuga da corte portugue- sa de dom João para o Rio de Janeiro e eleito Melhor Ensaio de 2008 pela Academia Brasileira de Letras; 1822, sobre a Independência do Brasil; e 1889, sobre a Proclamação da República, além de O caminho do peregrino, em coautoria com Osmar Ludovico – todos publicados pela Globo Livros. Formado em Jornalismo pela Universidade Federal do Paraná, com pós-graduação em Administração pela Universidade de São Paulo, é titular da cadeira dezoito da Academia Paranaense de Letras.
Na tarde em que o príncipe dom Pedro chegou às margens do Ipiranga, em 7 de setembro de 1822, o Brasil estava empanturrado de escravidão. Comprar e vender gente era o maior negócio do novo país independente. Homens e mulheres escravizados perfaziam mais de um terço do total de habitantes, estimado em 4,7 milhões de pessoas. Outro terço era composto por negros forros e mestiços de origem africana uma população pobre, analfabeta e carente de tudo, dominada pela minoria branca. Os indígenas, já dizimados por guerras, doenças e invasão de seus territórios, nem sequer apareciam nas estatísticas. O Brasil seria o último país da América a acabar com a escravidão, pela chamada Lei Aurea de 1888, quase sete décadas após o Grito do Ipiranga. A “segunda abolição”, preconizada pelos abolicionistas, jamais aconteceu. O país nunca se tornou uma “democracia rural”, mediante a redistribuição de terras do latifúndio improdutivo. Jamais promoveu negros e mestiços à condição de cidadãos plenos, com os mesmos direitos assegurados aos demais brasileiros. Sem acesso a educação, moradia, saúde, renda e condições dignas de vida, a população afrodescendente brasileira foi abandonada à própria sorte, marginalizada, explorada sob formas disfarçadas de trabalho forçado e mal remunerado. Era assim em 1822. E assim permanece ainda hoje, dois séculos após a Independência.
Laurentino Gomes
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